OGLOBO/MARINA GONÇALVES 11 Noviembre 2015.- A imagem de Génesis Carmona, modelo e miss venezuelana, sendo carregada durante uma manifestação no estado de Carabobo, em fevereiro do ano passado, correu o mundo. A jovem de 23 anos, que foi baleada na cabeça e morreu horas depois, é um dos símbolos dos violentos protestos que deixaram dezenas de mortos e centenas de feridos no país. Mais de um ano e meio depois, parentes das vítimas e opositores apresentaram uma solicitação à procuradoria do Tribunal Penal Internacional (TPI) para que o presidente Nicolás Maduro e altos funcionários do governo sejam investigados por crimes contra a Humanidade durante as manifestações. O pedido foi feito pelo opositor Carlos Vecchio, coordenador do partido Vontade Popular, durante visita a Madri. Em Haia, uma fonte do TPI confirmou o recebimento do documento. Caso seja aceito, o órgão irá avaliar se há material para a abertura do caso.

— Estamos trabalhando há mais de um ano documentando casos, reunindo denúncias e consultando especialistas porque queríamos apresentar uma denúncia consistente — afirmou Vecchio ao GLOBO, por telefone da capital espanhola. — Estamos pedindo formalmente ao tribunal que seja feito um exame preliminar do documento. Temos provas contra altos funcionários do governo que cometeram crimes de lesa-Humanidade, como assassinato, tortura e perseguição. Não podemos citar nomes, mas estão incluídos ministros, membros da Assembleia Nacional, funcionários do Judiciário e militares de alta patente. E claro, o próprio Maduro.

Segundo o documento de quase 200 páginas, o saldo dos protestos é alarmante: foram mais de 30 supostos homicídios e 800 feridos, 3.700 detenções consideradas ilegais, e cerca de 400 casos de tortura, além de dois mil julgamentos contra manifestantes pacíficos desde fevereiro de 2014.

O pedido foi feito em nome de um grupo de vítimas — dentre elas o próprio Vecchio. O governo, no entanto, culpa o opositor Leopoldo López, do mesmo partido de Vecchio, pelas mortes: López cumpre pena de quase 14 anos de prisão por incitar a violência durante as manifestações; Vecchio vive nos EUA há um ano e três meses e se diz vitima de perseguição política. Franklin Nieves, promotor dos dois casos, deixou o país e denunciou o governo por pressões.

Para Armando Chaguaceda, cientista político cubano que estuda as relações de poder na América Latina, o pedido à instância internacional evidencia o esgotamento das denúncias em nível nacional e regional.

— Diversas organizações tentaram acionar instâncias nacionais e interamericanas. Mas a falta de respostas evidenciam o quase total controle do Judiciário pelo Executivo do país — disse Chaguaceda ao GLOBO. — É mais um capítulo na saga de denúncias de organizações defensoras de direitos humanos em relação à Venezuela. O mais importante é dar visibilidade internacional à imensa deterioração da democracia no país.

Assim como o cientista político, Elenis Rodriguez, da Fundação por Direitos Humanos e Igualdade Cidadã (Fundeci), comemorou a decisão. A ONG venezuelana vem tentando, há mais de oito meses, incriminar o governo pela morte de Bassil Dacosta, primeira vítima dos protestos, em fevereiro do ano passado. Após seis audiências, o juiz foi destituído do caso, no mês passado.

— Ele foi assassinado por policiais do Estado. Mas apesar de todas as provas, lutamos contra o Poder Judiciário, que está atrasando intencionalmente o processo. Internamente, o governo continua tentando mentir em relação aos culpados pelas mortes, acusando a oposição — afirmou.

A denúncia ao TPI não é a primeira. Em março, o relator especial para Tortura do Alto Comissariado da ONU para Direitos Humanos, Juan Méndez, apresentou um relatório acusando o governo de violar “o direito a não ser torturado e nem ser preso de forma arbitrária”. A Human Rights Watch também havia denunciado Maduro “por tolerar e incentivar um padrão sistemático de violência, com cumplicidade do Judiciário e do Ministério Público”.

A menos de um mês das eleições legislativas de 6 de dezembro, Vecchio defendeu a urgência do pedido, diante de declarações ameaçadoras de Maduro no fim do mês — o presidente disse que, diante da possibilidade de uma maioria opositora no Parlamento após as eleições, como preveem as pesquisas, “defenderia a revolução a todo custo”. A procuradoria do TPI costuma demorar entre três e seis meses para decidir sobre este tipo de petição.

— O pedido é uma maneira de avisar o mundo que necessitamos de apoio para evitar mais violência durante o processo eleitoral. Sabemos que dificilmente teremos uma resposta em 20 dias, mas cumprimos nossa obrigação de mostrar a urgência do caso — disse Vecchio.

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